Um Banco Central contra o povo e pela especulação
 

Publicado em quarta-feira, 13 de janeiro de 2016 às 16:28

 
Semelhante à mulher de César, que não basta ser honesta mas tem que parecer honesta, ao Banco Central do Brasil não basta ser uma espécie de vampiro da sociedade brasileira, sugando-lhe o sague em favor de especuladores financeiros. Ele se vê no direito de confessar publicamente essa condição quando defende sua política como direito divino, o que transparece, mensalmente, ao anunciar as taxas de juros sempre crescentes nas reuniões do Copom (diretores), num sentido que invariavelmente desagrada 99,9% dos brasileiros.

Qual seria a fonte de poder dos diretores do BC, reunidos no Copom, para promoverem, sem dó nem piedade, com total autonomia e discricionariedade, a transferência centenas de bilhões de dólares anuais de ricos para pobres através de um verdadeiro assalto ao Tesouro? Não é poder político parlamentar, pois o BC neutralizou os políticos dizendo que são populistas. Infelizmente é o Executivo. Mas não pelo que o Executivo o manda fazer, mas pelo que o Executivo faz questão de que ele não faça, ou seja, defender o interesse público.

O BC tem um código de honra, similar aos das máfias italiana e americana, pelo qual seus membros atuais e anteriores se cercam de segredos para evitar o escrutínio da sociedade em suas decisões na sombra. Nos anos mais recentes, a senha de acesso a esses arcanos tem sido o modelo de metas de inflação - o qual desmontamos peça por peça, o matemático Francisco Antônio Dória e eu, no livro “O universo neoliberal em desencanto” (ed. Civilização Brasileira). Não esperávamos um sucesso do livro, por motivos óbvios. E não aconteceu.

O problema que temos com o BC brasileiro é que se tornou, ao longo do tempo, uma caricatura ideológica neoliberal. Não há nenhuma inocência nisso. Um BC neoliberal rouba dinheiro do povo e transfere para os ricos. Não temos sequer um BC capitalista. O BC americano, FED, tem três objetivos legais: manter a estabilidade da moeda, garantir o crescimento da economia e promover o pleno emprego. No caso do BC brasileiro, estabelecido por FHC, o objetivo único do BC é o suposto controle da inflação.



É necessário muito pouco para demonstrar que a atuação do BC é um escândalo de incompetência e de má fé. No modelo de metas com que opera, a inflação deve cair quando o desemprego aumenta. Vejam o que aconteceu em 2014: a inflação estava estabilizada em torno de 6,5%, enquanto a taxa de desemprego caiu ao nível histórico mais baixo. Ao aumentar as taxas de juros, o BC mandou para o espaço a chamada curva de Phillips, uma das bases de seu modelo de metas: a inflação aumentou e a taxa de desemprego também aumentou, ao contrário do que preveria a curva.

Até quando vamos tolerar esse câncer incrustrado na economia brasileira, que alimenta simultaneamente a inflação e o desemprego? Esta, seguramente, é uma questão política. Já dei notícia da Aliança pelo Brasil, um movimento parlamentar e social que iremos promover com o duplo objetivo de combater a irresponsabilidade do impeachment e promover uma nova política econômica. Pois bem, em termos de macroeconomia o foco de nossos objetivos é uma mudança radical do BC. Num país em desenvolvimento, não podemos nos dar o luxo de ter um BC contracionista. Temos que ter um BC progressista.

P.S. O Governo fez bem em admitir mudança na MP dos acordos de leniência, a despeito da impertinência do TCU que resolveu meter a colher de chá onde não era chamado. Vigiado pela Procuradoria da República, pela AGU e pela CGU, o TCU não terá muita margem para atrapalhar ou viciar os acordos, que defendi desde o início do ano passado quando a classe dominante ainda se mostrava acovardada em tocar no assunto.


J. Carlos de Assis
*Economista, doutor pela Coppe/UFRJ, autor de “Os Sete Mandamentos do Jornalismo Investigativo”, Ed. Textonovo, SP, 2015.



 
Fonte - Carta Maior